Parecia um desses personagens enigmáticos treinados por Wim Wenders, bastava olhar para seu rosto para sentir uma inquietude distante e ansiosa. Mesmo seu semblante sobrou esfalecido pelos dias em que esteve viajando para dentro da própria cabeça. Gesticulava mais porque já não dizia tanto quando antes, seus verbetes bem-selecionados por ora passeavam pelas canetas que costumava carregar nos bolsos por onde se aventurava. Silencioso, muito silencioso. Tive com ele um dia desses em algum espelho de bar engordurado e trincado da cidade e nos olhamos nos olhos até que todos os nossos olhos pudessem lacrimejar. Pela primeira vez pude ver as suas rugas, seu relógio em pleno funcionamento e até os cabelos se esbranquiçando. Sibilava sussurros incompreensíveis e sorria um sentimento descomunal. Não parecia estar voltando de uma viagem ou se preparando para outra, como muito gostava de fazer nas tardes de inverno. Apenas parecia satisfeito de estar ali, do outro lado, imitando os meus sorrisos e desconversando as minhas conversas em silêncios repentinos.
Bernardo Biagioni
Bernardo Biagioni
Um comentário:
Muito bom!
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