sexta-feira, dezembro 12, 2008

4:00am

Era alguma baladinha romântica, uma latinidade que só pode ter sido importada de Cuba. Lembro que tinha um saxofone incendiário que corria pelas paredes até explodir no chão. E ela usava um vestido daqueles coloridos que ficava dançando com seu calcanhar, bem devagarzinho. Balançava seu corpo com leveza e calmaria, como se o mundo girasse a seu favor. Eu continuava deitado, encarando-a, sobretudo para resguardar minha pose racional para enquanto não rompesse a madrugada. Por fim, ergui-me sem lamento, tomei seu corpo pelo centro e estiquei até onde pudesse ser esticado. Deu com as costas no assoalho lavado e voltou com força suficiente para me derrubar. Segurei-me na parede e deixei cair o quadro de Gardel. "Incompriensível", devo ter reclamado. Deitei-a logo ao pé da cama e desatei o nó forjado da minha gravata. Um traço gelado de liberdade desceu ríspido pela espinha até arrepiar-me a nuca. Deslizei meus dedos por suas costas até conseguir o mesmo efeito. Cravei as unhas em alguma parte de seu corpo que tremeu. Olhou-me, então, com raiva e avisou: "menino, não esqueça quem eu sou". Reclamou o que eu clamava, vestiu o vestido pelo avesso e voltou a dançar.

Desgraçada.

Bernardo Biagioni

2 comentários:

Unknown disse...

Simplesmente, ADORO suas histórias!!!

;)

Jackellyne Oliveira disse...

desgraçado és tu q n a tem nem nos contos!!!!!