quarta-feira, dezembro 17, 2008

De dentro da Heineken (II)

Já faz algumas semanas que ele chega atrasado. Não sente mais fome, mas continua se alimentando daquela poeira toda: Bukowsky, Ginsberg e Rimbaud. Fica andando com eles pra cima e para baixo, como se fossem amigos, dá pra acreditar? Também tem cheiro de erva. Ele acha que não sei que aqueles incensos na porta do quarto são para disfarçar o cheiro de erva. Aí entra no elevador meio tonto - ele não sabe, mas a vizinha do quinto andar já percebeu. Então dá um segundo trago assim que chega na garagem. "Não tem ninguem por perto", exclama baixinho enquanto tenta fazer o isqueiro funcionar pela terceira vez. Na quarta coloca fogo na mão, mas não sente tanto quanto antes. O carro não está lá. Merda. Tenta lembrar do último estacionamento, "talvez a rua lateral". Uma raiva latente corre por seu corpo até desaparecer num sorriso enigmático. É como se, por um momento, visse glamour naquilo tudo. Então acelera pelos ruas estreitas da cidade grande, as luminárias dos postes correndo pelo retrovisor. Vai serpenteando o carro pelas ruelas com destreza, cortando pelas esquerdas, centros e direitas. Não tem o medo de antes. Nem deve ter de novo. Escuta agora Piaf e tenta parecer francês em todo sinal de trânsito que respeita. Como se o motoboy importasse. Está sempre atrasado, mas nunca tem compromisso. Eu sei que ele tenta ser respeitável. Em alguma hora da madrugada ele volta. Custa acertar a chave na fechadura - isso explica a maçaneta arranhada - e deita no primeiro móvel que o aceitar. Ás vezes encontro-o no chão, sorrindo. É, ele está sempre sorrindo. Então arrasto seu corpo até um colchão velho e coloco um copo d'água bem do seu lado. Ele costuma ter sede nestas madrugadas. Bem, você sabe como é...


Bernardo Biagioni

4 comentários:

Anônimo disse...

Estou adorando sua nova forma de escrever, mais aberta, real e com uma beleza suja. Está ficando mais verdadeiro. E a vida é isso mesmo, um aglomerado de derrotas e conquistas, tudo misturado em uma coisa só. Lindo, lindo.

carloshauck disse...

Bernardo... coloquei minhas fotos do Music Station no meu blog.... depois confere lá.
Abraços,
Carlim.

http://carloshauck.blogspot.com/

Jackellyne Oliveira disse...

se "ele" for um cachorrinho d estimação, manda p k q eu cuido!!!!!mas se "ele" paga impostos deixa a lombra passar q a gente conversa...

Anônimo disse...

Te mandei um e-mail sobre a Ilma. Heineken, recebeste (antes: meu ponto de interrogação faliu!)>>>>>
Foi para o end. de e-mail que está no seu perfil, no orkut.
Att,

L.C.