quinta-feira, maio 03, 2007

A Lamentável Trajetória de Patrick

Era pouco mais que 2:00 da madrugada quando eu cheguei no ponto de ônibus da Savassi, bairro tradicional da cidade de Belo Horizonte. Estava com um fiel amigo de fotografias de baixa qualidade (celular), Bruno Pimenta, e lamentávamos baixinho os probleminhas da vida.


Eis que chega cantarolando um samba antigo um velho conhecido, Patrick, 12, morador e adorador da favela "Morro do Papagaio". Conhecemos o Patrick em Junho do ano passado, ele estava em um sinal de trânsito perto de um grande shopping da região do Belvedere, bairro nobre da cidade. Na ocasião, convidamo-lo junto com seu irmão Ricardo, pouco mais velho, para andar nos nossos skates. Os garotos fizeram a maior festa, ficavam divididos entre os “carrinhos” e a bicicleta de um outro amigo nosso. O sorriso que cultivavam abertamente na face não deixava negar o quanto se divertiam, alimentava também a nossa alma um tanto quanto enferrujada.

Fiquei um bom tempo sem vê-los, ate que encontrei o Patrick fazendo malabarismo em um sinal de trânsito da Savassi. Ele jogava desordenadamente duas bolinhas para o alto, depois fazia o clássico gesto de agradecimento e vinha correndo em direção aos carros. Abri o vidro e fui logo o chamando pelo nome. Ele estranhou, e antes que eu pudesse lembrá-lo do memorável dia dos skates, o sinal abriu e meu tio arrancou o carro.

Alguns dias depois eu estava sentado em um bar e o vi passar correndo com alguns amigos. Só se ouvia da boca do Patrick "corre de menor, corre!" Atrás vinha o dono de uma padaria, bufando e parando aos poucos. Ele virou para a nossa mesa e desabafou enquanto tomava ar: "roubaram um pacote de chips na minha padaria, meninos filhos duma p***".

E fiquei um bom tempo sem vê-lo, sequer lembrava do rosto dele. Até que ontem eu o encontrei. Ele vinha na minha direção cantando o sambinha, e antes que estendesse as mãos para me pedir uns trocados eu lhe chamei pelo nome. Ele me olhou assustado, os olhos pretinhos e arregalados como na vez do sinal de trânsito. Para nossa surpresa, minha e do Bruno, ele cheirava uma garrafinha pet de 500ml, que abrigava um resto de cola. Já sentados no passeio, tentávamos lembrar ele do dia em que ele saiu com a gente. Não demorou muito.

Patrick largou a garrafa e abriu um sorriso que, com certeza, jamais vou esquecer. E dividido entre eu e Bruno, começou a recitar os fatos: "poxa, era um skate grandão assim oh" e com um olhar distante esticava as mãos para desenhar a sua saudade.

Ficamos um tempo com os clássicos sermões de quem se preocupa com um ente querido. E falávamos que ele tinha que largar a cola e estudar. Bruno perguntou o que ele preferia: uma garrafa cheia de cola ou um brinquedo. De novo ele mirou os olhos negros para um vácuo e começou a falar bem alto "um brinquedo, claro! Igual daqueles que tem no Mc Donalds.”

O Bruno tirou o celular do bolso e tirou algumas fotos do Patrick, ria baixinho enquanto falava: "vou provar para todo mundo que eu tenho um filho sim!" Patrick e seu amigo que havia chegado pouco depois ficaram enlouquecidos de poderem se ver em uma telinha tão pequena.

E sem mais nem menos ele levantou, olhou para os amigos e disse: vamos! Olhou para a gente e disse que ia dormir por ali mesmo que estava com muito sono para esperar o ônibus. Segurei a mão dele e busquei os seus olhos, mas estavam depositados no chão. Senti um aperto no peito, uma tristeza fria percorrendo cada espaço do meu corpo. Olhei para o Bruno e vi que ele sentia o mesmo. Pegamos o mesmo ônibus, mas não trocamos nem uma palavra sequer durante todo o caminho.

É essa a historia do Patrick, pelo menos até aqui. O final, os olhos dele vão escrever. Talvez com a ajuda de um pai alcoolizado ou de uma mãe escravizada pela sociedade. Ou talvez ainda por pessoas sensibilizadas com situações semelhantes a essa, como eu e o Bruno, que havemos de lutar de aqui em diante por pelo menos uma cidade melhor.

Lutemos.

3 comentários:

rear window disse...

coisas da vida
vai entender..

kanpeao disse...

bom ver um relato q mostra q naum sao todos q saum cegos a dura realidade, deus abençoe os q saum..

Anônimo disse...

Meu sobrinho!
Ha'u hadomi o!
(Te amo!)
Em Timor!!