segunda-feira, agosto 24, 2009

Sourde

Sempre disse não antes mesmo de pensar que poderia dizer sim. Não escutava as investidas maliciosas do orvalho matinal que se ajeitava nos vidros dos carros estacionados na rua e pensava - apenas pensava - que toda aquela música que tocava na madrugada era sua. Rá, como eu ria disso tudo, andando de um lado para o outro, correndo os dedos pelos ponteiros despontuados do relógio da parede e vendo a noite ser dia, a chuva secando e as nuvens se abrindo. Vivia pela metade - e ainda vive, claro - e hoje eu consigo ver isso nitidamente. Suas vontades eram dormentes, suas súplicas tristes e seus desejos eram tão e tão pequenos quanto a felicidade que parecia ter. Pensava lá na frente, no depois do depois, na curva dos meses, nos encontros arrependidos e nos lábios que se perdiam pelos deslaços do tempo. Não soube viver o presente e acabou se perdendo do nosso futuro. E hoje não escreve mais, não sorri tanto e todos seus incontáveis sonhos estão mais uma vez conversando com seus pensamentos surdos. Completamente surdos.

Bernardo Biagioni

Um comentário:

gabriela pimenta disse...

meu deus, como eu precisava de ler isso.