Olhe bem em volta meu amigo, os tempos estão estranhos. Esperava o ônibus escondido sob um toldo minúsculo, os pingos de chuva pintavam minha camisa e meu nobre-companheiro-vizinho-de-espera-do-ônibus não cedeu nem mesmo um cantinho no verdadeiro guarda-sol que carregava. Tanto faz, mais tarde ele iria passar por poucas e boas. Corri a mão pelos bolsos para resgatar um pedacinho daquele velho fone de ouvido, peguei-o antes que tocasse o chão colorido por chicletes antigos.
Ao reerguer a cabeça estava trocando olhares com o motorista da linha 747, ele gritava e abanava os braços como se fosse um macaco: “não vai subir não, ô idiota?”. Pelo menos foi o que eu consegui escutar, não hei de saber o que havia dito antes ou depois, o som nos meus ouvidos já estavam altos
Para fazes jus ao ambiente “sauna gay” um moleque baixinho cuidando bem mal de seus 12 anos levantou no meio da muvuca: “Boa tarde. Poderia ta matando, seqüestrando ou estuprando as madames. Mas to aqui pra vender pedras de eucalipto. Você pode colocar no seu carro, no seu quarto, no banheiro e vai ficar esse cheirinho bacana!” Um sujeito de sunga levantou bem no fundo do “balaio” e ofereceu seu lance: “É meu! Pago 20 merréis nessa porrinha!” Ninguém entendeu merda nenhuma. O amigo levantou enquanto deslizava as mãos pela face buscando uma pitada de suor para auxiliar na contagem das notas.
A situação se normalizava, algumas janelas eram abertas para evacuar aquele cheiro enjoativo e uns engraçadinhos emparelhavam o carro na velocidade do busão gritando freneticamente: “Eii seu motô me dá uma bola desse eucalipto aí”. E os filha-da-puta riam desesperadamente enquanto dichavavam-enrolavam-e-cochavam o próprio baseado.
Uma freada brusca colou o corpo enrugado de uma senhora de idade no vidro dianteiro da embarcação. Subiu à bordo três malucos com meia-calça na cabeça gritando para qualquer cabeça de todo o quarteirão ouvir: “Todo mundo parado, isso é um assalto”. Vale lembrar que as pessoas não costumam caminhar enquanto fazem uma viagem tranqüila em uma linha de ônibus tradicional. A primeira badalada da arma de fogo do cidadão fantasiado acertou um passarinho que fazia ponto por aquelas bandas e fez com que todo mundo descesse correndo por todos os cantos do balaio. Os três malucos ficaram completamente desordenados com a confusão e não puderam evitar nem mesmo a fuga do motorista e do trocador.
Os filha-da-puta da meia calça descarregaram o tambor da arma enquanto assistiam as últimas almas desaparecerem na esquina. Rodaram a chave na ignição e levaram embora o último carro operacional da linha 747. Tempos estranhos, meu amigos. Tempos muuuito estranhos. Na dúvida, pegue um táxi.
Um comentário:
strange times indeed my friend...
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